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  • Assessoria de Imprensa

Doação de Sangue Homossexuais




Um tema de grande expectativa para esta semana é o julgamento da ADIn 5.543 contra a portaria 158/16 do Ministério da Saúde e a resolução RDC 34/14 da Anvisa, que trata da proibição de doação de sangue por homossexuais.


O julgamento teve início em 2017 no Supremo Tribunal Federal, onde o Relator, Ministro Luiz Edson Fachin, concedeu liminar para suspender os efeitos das normas supramencionadas até o julgamento final pelo Plenário da Corte. Os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux acompanharam o relator, observando que deveriam ser definidas práticas de risco, e não grupos de risco. Por outro lado, o ministro Alexandre de Moraes inaugurou divergência, votando pelo parcial provimento.


Resumidamente, a inconstitucionalidade apontada na ADI em questão decorre do critério discriminatório do legislador federal que, invocando estatísticas de duvidosa comprovação, adota o conceito de grupo de risco, no lugar de comportamento de risco.


Assim, ao excluir indivíduos do sexo masculino que tiveram relações sexuais com outros homens nos doze meses anteriores à entrevista, considerando-os grupo de risco, estigmatiza os potenciais doadores independentemente da verificação de seu comportamento de risco, este associado (não à orientação sexual, mas) ao relacionamento promíscuo que comprometeria a segurança da doação, seja por homossexuais seja por heterossexuais.


Desse modo, outorga-se tratamento diferenciado para duas situações equivalentes, em violação dos princípios da igualdade, da liberdade de autodeterminação sexual e da dignidade humana.


Salvo melhor juíuzo, a doação de sangue não se torna mais confiável por conta do questionário discriminatório, quer pelo avanço tecnológico, capaz de garantir, cada vez mais, a segurança das transfusões, quer pela necessidade de se aferir, nas entrevistas aos potenciais doadores, se o seu comportamento coloca em risco o sistema, não já a sua orientação sexual. Assim sendo, chega-se à conclusão de que, além de inúteis para a proteção da sociedade, tais normas criam rótulos que recrudescem o preconceito de que são tradicionalmente vítimas os homossexuais. A vedação imposta pelas normas questionadas contradiz os avanços e conquistas obtidos pelas famílias homoafetivas sob a chancela do Supremo Tribunal Federal. Em 2011, no julgamento conjunto da ADI 4277 e da ADPF 132, a Corte reconheceu que a união estável entre pessoas do mesmo sexo constitui entidade familiar protegida pelo ordenamento jurídico brasileiro. Na contramão de tal orientação, os questionários apresentados aos doadores de sangue excluem os doadores que vivem em uniões estáveis homoafetivas, estimulando a discriminação ou a mentira sobre a vida sexual pregressa dos candidatos.


Ademais, é imperioso sempre protestar pelo respeito à igualdade das famílias. Nesse sentido, o reconhecimento das famílias homoafetivas como entidades familiares juridicamente protegidas não se harmoniza com a discriminação dos membros dessas entidades, despojando-os de direitos básicos que reafirmem sua autodeterminação sexual e dignidade, corolários de sua capacidade plena para cultivar valores familiares. A restrição apontada, nessa perspectiva, acaba por relegar as famílias homoafetivas à situação de inferioridade, privando-as da doação de sangue que muitas vezes se revela essencial para a tutela dos seus integrantes.


Por força das normas em questão, estima-se que 19 milhões de litros de sangue, que poderiam salvar vidas e amenizar sofrimentos, são desperdiçados anualmente no Brasil. Em boa hora, portanto, o Supremo Tribunal irá se posicionar sobre a matéria, trazendo a lume novos desdobramentos da proteção da personalidade humana e dos direitos humanos, em que o público e o privado se conjugam na promoção da autonomia existencial, exigindo-se do intérprete atenção para que estereótipos arraigados na sociedade não acabem por ameaçar a plena realização da pessoa humana na legalidade constitucional democrática, igualitária e solidária.

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